Brenda Ligia-Cinema,TV,Teatro

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Brenda Ligia é atriz, mestre de cerimônias, diretora, apresentadora e locutora trilíngue (inglês/francês). Como atriz, atuou em 15 longas, 12 séries de TV, dezenas de curtas e espetáculos. Prêmios/ ATRIZ -Prêmio de melhor atriz no Brazil New Visions Film Fest (2023) -Prêmio de melhor atriz no Festival Riba Cine RJ (2022) -Prêmio de melhor atriz no Festival CinePE (2017) Prêmios / Diretora: -Prêmio Diáspora no Silicon Valley African Film Festival (USA, 2020) pelo seu curta Contraste, lançado pela MídiaNINJA -Prêmio Empathy no Essential Stories Project USA (2020) pelo seu documentário Ilê -Prêmio Especial no Cine PE (2014) pelo seu documentário Rabutaia CINEMA Cidade; Campo (Berlinale) 2024, Amado (Globoplay, Telecine) Sangue Azul (Netflix), Bruna Surfistinha (Netlix), etc. TV Séries Além do Guarda-roupa (HBO Max), Assédio (TV Globo, GloboPlay), Sob Pressão (Globo), A mulher do prefeito (Globo), etc. MC Brenda Ligia está na lista das 10 melhores mestres de cerimônias do Brasil, via Super SIPAT. Contato: atendimento@castinglab.com.br

9 de agosto de 2018

Hora de Vacinar

Começou a campanha nacional de vacinação contra poliomelite e sarampo. Levei meu filho ao posto de saúde da Vila Romana, em São Paulo. Estava cheio, mas estávamos acomodados. Mães, pais, avós. Crianças, idosos, bebês. Na sala de espera, o painel apitou a próxima senha. Entrou a mãe com bebê de colo. 


Meu Raul, zanzando entre uma criança e outra, esbarrou levemente no pé direito do senhor ao lado. Este, exagerado, se contorceu, gemendo. Nós, mães, trocamos olhares cúmplices: havia uma estranheza no ar. 
Pedi desculpas, e o senhor disse:
-"Não foi culpa dele; foi culpa da maldita podóloga que me arrancou um bife". 
-"Você ficou sem bife?", perguntou meu filho de 3 anos. 
Ele não respondeu. Nem mesmo um amarelo sorriso cordial. 
Por precaução, mudei de lugar para mantê-lo distante da minha criança. Espera.
Mais espera. 
Fuçando no celular, o senhor deu play num volume bem alto. As crianças, naturalmente atraídas pela música, bisbilhotavam a tela do aparelho. Ele, irritado, bufava tentando manter seu artefato tecnológico barulhento longe dos pequenos 'sem modos'. 
Travou-se embate velado: nós, cuidadores, afastando os rebentos da armadilha do cidadão peculiar. Um alvoroço; teve um que até chorou. Aí o pai botou galinha pintadinha pra acalmar o pequeno. 
Abriu-se, finalmente, a porta da sala de vacinação. Confesso que todos tínhamos a esperança de que a mãe saísse com seu bebê, para avançarmos nas senhas intermináveis, sem delongas. 
O distinto senhor “de bem” não se conteve. Imperativo, bradou:
-"Só no Brasil a gente é trouxa pra aguentar essa demora!" 
O enfermeiro veio à porta. E ele continuava gritando:
-"Precisam contratar gente mais preparada!"
Olho no olho. O profissional respondeu:
-"Estou sozinho para atender todo mundo, senhor". 
-"Isso não é culpa minha!", o paciente retrucou. 
-"Ninguém aqui vai ficar sem vacina", apaziguou o doutor. 
-"É igual vacinar gado!", o velho disse. 
-"Então o senhor me desculpe, mas está no lugar errado. Porque aqui tem médico e enfermeiro, mas não veterinário". 
Nós, a torcida na sala de espera, vibrávamos discretamente. 
O dito cujo cozinhava seu ódio em sangue nos olhos. As crianças, estateladas, todas olhavam pra ele. O ogro. Até o bebezinho, nessa hora, acordou. 
-Sabe o que vou fazer?! - urrava em descontrole.
Nada paciente, ele foi caminhando em direção ao enfermeiro. Gelei. Que SUSto. 
Ele ergueu seu cartão dos SUS, desafiando a figura do médico, e amassou-o em pedaços. Se vangloriava, dizendo: “Eu não preciso disto! Eu tenho dinheiro!” 
E o homem jogou o cartão na cabeça do profissional, gente. Na cabeça dele, juro.


Essa pausa de um parágrafo representa a sala de espera depois que o brutamontes saiu. Cruz credo. Climão.
Leandro Torres, o bom profissional, respirou fundo para recuperar sua elegância. Olhou para toda sua gente, sorriu para a criançada e disse: 
-Esperem aí que o tio está quase chamando a vez de vocês, tá bom?
E foi assim que todos foram vacinados hoje, pela manhã, na UBS da Vila Romana, onde um certo enfermeiro Leandro Spalato Torres, o famoso “tio Lelê” da criançada, faz a diferença todos os dias. Com ele, trabalha também o enfermeiro Cláudio… (qual sobrenome?), que é igualmente genial no trato com nossos pequenos. 
Por mais profissionais como vocês, que amam o que fazem. Obrigada pelo carinho, atenção e cuidado com as pessoas que usam o sistema público de saúde no Brasil.
Porque gente não é gado.

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