Brenda Ligia-Cinema,TV,Teatro

Minha foto
Brenda Ligia é atriz, mestre de cerimônias, diretora, apresentadora e locutora trilíngue (inglês/francês). Como atriz, atuou em 15 longas, 12 séries de TV, dezenas de curtas e espetáculos. Prêmios/ ATRIZ -Prêmio de melhor atriz no Brazil New Visions Film Fest (2023) -Prêmio de melhor atriz no Festival Riba Cine RJ (2022) -Prêmio de melhor atriz no Festival CinePE (2017) Prêmios / Diretora: -Prêmio Diáspora no Silicon Valley African Film Festival (USA, 2020) pelo seu curta Contraste, lançado pela MídiaNINJA -Prêmio Empathy no Essential Stories Project USA (2020) pelo seu documentário Ilê -Prêmio Especial no Cine PE (2014) pelo seu documentário Rabutaia CINEMA Cidade; Campo (Berlinale) 2024, Amado (Globoplay, Telecine) Sangue Azul (Netflix), Bruna Surfistinha (Netlix), etc. TV Séries Além do Guarda-roupa (HBO Max), Assédio (TV Globo, GloboPlay), Sob Pressão (Globo), A mulher do prefeito (Globo), etc. MC Brenda Ligia está na lista das 10 melhores mestres de cerimônias do Brasil, via Super SIPAT. Contato: atendimento@castinglab.com.br

1 de agosto de 2018

Comercial do Boticário - dia dos pais

O que você vê nessa foto? Uma família brasileira em comercial de televisão?
Atriz Brenda Ligia, ator Fábio Ventura e os atores Ana, Matheus e Diego
Gravação do comercial de Dia dos Pais dO Boticário (2018)



O que você vê nessa foto? Uma família brasileira em comercial de televisão?
São Paulo, junho de 2018. Set de filmagem do comercial de dia dos pais de O Boticário; criado pela AlmapBBDO e produzido pela Paranoid BR. Elenco: Fábio Ventura (pai), Diego Aquino (filho mais velho), Matheus de Jesus (filho do meio), Ana Beatriz Anjos (caçula), e eu, Brenda Ligia Miguel, atriz no singelo papel de mãe. Direção: Luciano Podcaminsky. Obrigada, Nossa Senhora do Casting.
Na televisão, o filme teve estreia em horário nobre, rede nacional. Está no ar desde semana passada. Na internet, foi postado há menos de uma semana e já tem quase 8 milhões de visualizações.
Link do comercial (versão 30 segundos): https://youtu.be/-9tTjYmnVLE
Segundo Folha de S.Paulo, “a campanha de O Boticário com a modelo Gisele Bündchen, feita há três meses, tem 8,9 milhões de visualizações”. 

Pesquisa divulgada pelo IBGE revela que em 2016, a população brasileira era de 205,5 milhões de habitantes e os brancos são minoria, representando 44,2%. Os pardos são a maior parte da população (46,7%) e os pretos 8,2% do total de brasileiros. A população negra brasileira movimenta aproximadamente 800bi ao ano. O Boticário certamente sabe disso. 

Como atriz, gravei dezenas de comerciais. Este é o primeiro onde formo família de classe média alta, inteiramente negra, na condição de protagonismo, o que, aparentemente, incomodou muita gente. Segundo O Globo, “os internautas criticaram a marca ‘pela falta de representatividade de brancos’ na campanha. No YouTube, a versão de 30 segundos do filme, postado pela marca O Boticário, gerou mais de 17 mil reações negativas na plataforma”. 

Na Exame:
“Uma mulher resumiu bem, nos comentários, a situação: 
-Negros: ficaram felizes em ver uma família negra em um comercial, representatividade
-Brancos não racistas: nem perceberam nada, viram apenas um comercial com uma família
-Brancos racistas: deram dislike e estão nos comentários destilando ódio e racismo, cobrando ‘representatividade’, sendo que 90% dos comerciais, séries, novelas, etc. são representados por brancos e eles não cobram a inclusão de negros, índios, descendentes de asiáticos.”
(Leia matéria de Guilherme Dearo, na íntegra; link acima)

Não falar sobre racismo não vai fazê-lo desaparecer. Victor Augusto, da UOL, escreveu: “apesar do número de pessoas que acham o contrário, o racismo existe, sim. Segundo o Atlas da Violência, a cada 100 pessoas mortas no Brasil em 2016, 71 eram pretas ou pardas. E o racismo existe, também, quando pessoas brancas não enxergam seus privilégios”. 

Charles Mills disse que nem todos os brancos são signatários do Contrato Racial, mas todos são seus beneficiários. Você ou sua família não precisam ter escravizado um negro para reproduzir a sociedade racista, mas é, no mínimo, co-responsável pela manutenção desse sistema. Portanto, todos nós temos obrigação de trabalhar nesta mudança, que é urgente. 

Nós consumimos, trabalhamos, sentimos, pensamos... como qualquer pessoa. Esperamos que, a partir de agora, mais diretores de elenco, de criação, roteiristas, agências de publicidade e produtoras se abram para artistas negros em posição de destaque nas produções brasileiras. Nós podemos ser o que quisermos! É excelente que existam alguns grandes artistas negros atuando no mercado, mas nós somos tantos... existimos e também merecemos oportunidade. 

"A única coisa que diferencia as mulheres negras de qualquer outra é a oportunidade" -Viola Davis, primeira negra a receber um Emmy na categoria de Melhor Atriz.

“O professor de ciências políticas da UERJ e da UNIRIO João Feres Júnior, um dos coordenadores do Grupo GEMAA Pesquisa, ajudou a escrever o estudo ‘Globo, a gente se vê por aqui?’, sobre diversidade racial nas telenovelas. De acordo com os dados, o percentual de atores negros em cada novela, em três décadas, foi de apenas 8,8%. As novelas têm 46,2% de presença de homens brancos, 45,2% de mulheres brancas, 4,4% de homens não-brancos e 3,8% de mulheres não-brancas.
Existe uma coisa na academia , chamada de ‘branquidade’, que é um sistema que trata o mundo como se a ausência do negro fosse natural, excluindo mesmo”. (Correio Brasiliense)

Eu, Brenda, sou fruto de uma geração que não se viu representada. Minhas bonecas brancas tinham olhos azuis e chuquinhas louras, cresci assistindo Xuxa e suas paquitas, alisei cabelo com Henê Marú ainda criança. As possibilidades de representação que nos eram dadas se restringiam a empregada doméstica (“quase da família”?), que entrava em cena para servir café aos senhores, ou a escrava rebelde, sensualizada, que ia pro tronco ao final do capítulo. Ao homem negro, restava também o pior dos estereótipos. Vamos dar um basta nesse cenário?

Sobre RACISMO REVERSO (texto essencial da Djamila Ribeiro):
“Não existe racismo de negros contra brancos ou, como gostam de chamar, o tão famigerado racismo reverso. Primeiro, é necessário se ater aos conceitos. Racismo é um sistema de opressão e, para haver racismo, deve haver relações de poder. Negros não possuem poder institucional para serem racistas. A população negra sofre um histórico de opressão e violência que a exclui. Para haver racismo reverso, deveria ter existido navios branqueiros, escravização por mais de 300 anos da população branca, negação de direitos a essa população. Brancos são mortos por serem brancos? São seguidos por seguranças em lojas? Qual é a cor da maioria dos atores, atrizes e apresentadores de TV? Dos diretores de novelas? Qual é a cor da maioria dos universitários? Quem são os donos dos meios de produção? Há uma hegemonia branca criada pelo racismo que confere privilégios sociais a um grupo em detrimento de outro. Um jovem negro pode ser morto por ser negro, eu posso não ser contratada por uma empresa porque eu sou negra, ter mais dificuldades para ter acesso à universidade por conta do racismo estrutural. Racismo vai além de ofensas, é um sistema que nos nega direitos. Há que se fazer a diferenciação aqui entre sofrimento e opressão. Sofrer, todos sofrem, faz parte da condição humana, mas opressão é quando um grupo detém privilégios em detrimento de outro”. 

O Brasil tem muito a evoluir; fomos um dos últimos a abolir a escravidão. Tem muito trabalho a ser feito, e deve começar dentro de cada um. Somos o país dos que fazem "piadas racistas" e depois dizem "era brincadeira", mantendo o prestígio e o emprego. Somos o Brasil que arrasta o corpo de uma mulher negra, morta, Cláudia Silva, amarrada numa viatura policial. Aqui, tem candidato à presidência denunciado por racismo, machismo e homofobia... ou seja, as coisas podem piorar. Somos o Brasil que mata e depois pede desculpas, afinal, “o mundo está ficando muito chato”.

Se está chato agora, imagina pros negros que são parados pela polícia por serem suspeitos sob sua cor de pele escura. Imagina pra menina de 5 anos que, na aula de balé, fica humilhada e sozinha quando outras crianças se recusam a dar a mão pra ela, porque é negra. Imagina para aquela mãe da favela da Maré, cujo filho de 14 anos foi baleado, e, antes de morrer, perguntou: “mãe, eles não viram que eu estava de uniforme?” 
Não, não viram, pobre menino brasileiro. Descanse em paz. 
Assim, aos poucos, matamos nossa juventude, enterrando mais um no índice do genocídio negro. Isso não é piada. 

Indico a leitura do romance histórico “Um Defeito de Cor”, que narra a vida da menina Kehinde, capturada na África e trazida para o Brasil em um navio negreiro para ser escravizada. Foi eleito pelo jornal O Globo um dos 10 melhores romances da década. A autora, condecorada pelo governo brasileiro com a comenda da Ordem de Rio Branco, por serviços prestados ao país por sua atuação anti-racista, é minha amada prima Ana Maria Gonçalves, conterrânea de Ibiá, Minas Gerais, Brazil, cidade onde nascemos, região do extinto Quilombo do Ambrósio. A Rede Globo já comprou os direitos da obra, e, em breve, deve virar série de TV. Que muitos negros sejam contratados para este trabalho vindouro, que reconta os capítulos sombrios da História de um Brasil de todos nós. 

Enfim... que este comercial celebre o dia dos pais para todos: pretos, brancos ou amarelos. Mando força também para aqueles cujos pais já se foram ou nunca sequer existiram. Mas meu abraço mais especial, sem dúvida, vai pro meu pai, Senhor Paulo Miguel, que, neste momento, na Suíça, celebra suas vitórias. Do meu pai herdei a negritude; homem forte, bom caráter, que sempre nos encheu de amor e orgulho. Este comercial, papai, dedico ao senhor. <3 amo="" cora="" div="" do="" dos="" muito="" o="" obrigada="" olhos="" onge="" perto="" por="" tudo="" voc="">

E segue o link do meu portfólio com cenas de cinema, televisão e teatro. Vai que O Boticário queira me contratar para a versão feminina da campanha de dia das mães 2019! rs rs rs
*Brenda Ligia Miguel, atriz: https://youtu.be/qlWW6E1rOGk


Para os que querem se aprofundar, leiam essa análise inteligente e sem papas na língua, por Ian Black
“Em pleno 2018, um filme de escala nacional, com budget gigantesco, anunciando um produto que é consumido por classes populares, ainda é tratado como exceção, como motivo de celebração, como algo CORAJOSO só pelo motivo de ser protagonizado por uma família preta. 
Enquanto isso, na seção gente, do Meio e Mensagem, há fotos de 27 profissionais contratados por agências em São Paulo. São 17 homens e 10 mulheres. Em comum, todos brancos. Enquanto isso, mulheres pretas simplesmente inexistem em agências e anunciantes (e aparecem nas peças publicitárias quase sempre com a pele clara e cabelos cacheados - o padrão dentro da exceção). Coragem pra resolver esse problema a gente não vê”. 

Obrigada a cada um dos internautas que curtiram o vídeo e compartilharam fotos, links, matérias. Obrigada também aos famosos que se engajaram virtualmente nesta causa (Roberta Rodrigues, Preta Gil, Lucy Ramos, Paula Lima, Bukassa Kabengele, Jean Wyllys, Monica Iozzi, David Miranda, Samara Felippo, Maria Ribeiro, Spartakus Santiago, Luciano Quirino... quem mais?).
Juntos, segundo a VEJA, “nós ganhamos de goleada”.

Que venham os próximos! <3 amor="" div="" favor="" mais="" por="">

Família negra em comercial de televisão do Brasil 

Nenhum comentário: